quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Incofessáveis desejos

 Às vezes, depois de terminar minhas obrigações, gosto de sentar do lado de fora deste café e observar a rua movimentada do centro da cidade. Apesar da estranheza do olhar daqueles poucos que me notam, passo desapercebida, tomando um capuccino lentamente.

Do outro lado da rua tem um açougue. Uma 'butique de cortes especiais', segundo as inscrições no toldo. Dentro dela trabalha um homem alto, muito forte e mal humorado. Depois da vitrine com peças penduradas, atrás do balcão de aço, pode-se notar o brutamontes manejar habilmente uma ferramenta. Ele fica a maior parte do tempo ali, naquela mecanica repetitiva e estranhamente sensual. Quase posso sentir a vibração da tábua e o barulho do cutelo separando ossos da carne. Um festival sangrento. Uma sinfonia de morte. Um espetáculo mórbido, cujo maestro exala suor e virilidade. Virilidade: significante do músculo do braço retesado, duro, produzindo o baque que me deixa hipnotizada.

Ao lado do açougue tem um escritório de advocacia. O dono é um homem franzino, de óculos redondos, pequenos e andar apressado. Não passa dos quarenta, apesar de a têmpora denunciar a chegada da calvície. Além do terno, anda com uma pasta de couro e sapatos pretos brilhantes, perfeitamente engraxados, impecáveis. Parece ser um homem extremamente metódico e organizado. Sua gravata está sempre apertada, o cabelo – apesar de pouco – sempre penteado e a roupa impecavelmente esticada. Assim que passa pelo açougue, escolhe as partes pintadas de preto do piso geométrico em frente ao escritório, como uma mania, um dogma, uma ordem a ser seguida obrigatoriamente antes de abrir a porta. Ordem: confluência e previsibilidade atordoantes e excitantes.

Na verdade, gosto de observar os homens em geral. Presto atenção no porte físico, no andar, na rusticidade de seus movimentos, na essência de sua natureza animal. Logo, perdida nos pensamentos, sinto as pernas formigarem, um frio subir pela espinha e a umidade atingir minhas roupas íntimas inundando e aquecendo o sexo por baixo da roupa. Minha mente voa, cria situações das mais diversas e me permitem ter um momento de luxúria, de prazer mundano.

Me imagino sendo possuída de forma abrupta. A roupa tirada com pressa, a calcinha rasgada, a lascívia do beijo e a respiração ofegante. Sinto mãos rústicas apertando minha cintura e meu quadril, meus seios pressionados contra um peito volumoso, sem a mínima chance de escapar. Gosto de pensar na possibilidade da vontade incontrolável ser o elemento principal da pressa em consumar o sexo. Um sexo intenso e, por que não dizer, violento. Daria tudo para sentir uma mão percorrer meu corpo, enlaçar meus pescoço, rodear as auréolas dos meus seios. Daria tudo pra sentir dedos ásperos apertarem minha coxa, minhas nádegas, com uma força quase insuportável. Gosto de me imaginar sendo possuída em um desses becos ermos do centro da cidade, sendo colocada abruptamente de frente para a parede, tendo a saia levantada e a calcinha colocada de lado, para receber um membro grosso e quente como brasa em uma única forte e viril estocada. O sexo urgente, que não pode esperar um lugar reservado. Precisa ser feito ali, naquele lugar, com o desejo queimando qualquer juizo.

E à noite, no escuro de uma cama, sem poder ver nada, sentir desconhecidos disputarem um espaço na minha pele, braços fortes de açougueiros e mãos gentis de advogados, todos juntos, tentando me possuir, lutando por meu corpo como animais sedentos. Poder tocar, poder sentir seus membros pulsantes com as mãos, sugá-los com avidez e depois ser invadida, sem ordem, por todos eles. Ter orgamos indefinidamente contínuos, ser usada como um objeto e depois, largada no leito, percorrer a mão pelo lençol molhado de suor e sêmen.

Então percebo que já se passou muito tempo, estou mordendo o lábio e segurando a parte interna da coxa com força. A tarde vai caindo e eu preciso voltar, trancar o portão principal do convento, me banhar com água fria e trocar de hábito para a última liturgia do dia.

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